Para mim, qualquer motivo é um bom motivo para celebrar a vida. Mas quando há uma razão especial, a celebração adquire outro sabor. Especialmente se a ocasião for festejada com um belo petisco.
E hoje tenho uma, duas, três razões para celebrar o aniversário um, dois, três das Three (maybe not so) Fat Ladies. Conheci o blog através do Ardeu a Padaria e fui imediatamente cativada pelas pitadas de humor com que as Three Fat Ladies temperam as suas receitas.
Andei às voltas a pensar o que haveria de fazer e nada me ocorria. Tentei fazer um exercício mental, concentrando-me nas Three Fat Ladies e deixando sublimar o que gostariam as senhoras, à luz da construção da sua imagem que o meu subconsciente fez. Vi um pão-refeição, com bacon, cebola e alecrim, mas rejeitei. Vi um bolo merengado, mas levei-o para o desafio dos Ms. E rejeitei à partida saladas e sopas. Nao sei porquê, mas não me pareceu o melhor para festejar o aniversário das três senhoras roliças. Um truque do inconsciente, concerteza. Queria algo exótico e facilmente poderia ter construído uma sopa ou salada com este adjectivo. Mas às sopas e saladas faltava uma certa substância de presença obrigatória nesta celebração. A dúvida manteve-se, até que me lembrei de ter pedido ao meu marido para escolher uma receita de um livro que tinha acabado de chegar à caixa de correio. Era “Food that celebrates life”, da Nigella Lawson, e o título não poderia estar mais apropriado à ocasião.
E é com um “Saké steak”, versão adaptada, que brindo a este terceiro aniversário das três senhoras redondinhas.
Saí do trabalho com a lista de ingredientes na agenda em direcção ao infantário, mas passando pelo supermercado primeiro. Para fugir a uma aventura radical na zona dos doces. Trouxe 3 bifes de vaca altos (c. 1,5 cm), coentros e cardamomo. Fiz uma marinada com uma colher de chá de mostarda de dijon em grão, 2 colheres de sopa de molho worcestershire, 1 c.s. de molho de soja, 1 c.s. de azeite e uma malagueta. Deixei os bifes a marinar por uma ou duas horas e, entretanto, fui para a sala, onde a minha filha construía castelos, torres e estórias com a sua caixinha de fantasia e de legos. Viajámos por florestas em mundos distantes, visitámos princesas e regressámos a casa, directas à cozinha.
Comecei a fazer o arroz selvagem que acompanharia os bifes. Perguntei à minha filha se ela me queria passar o arroz. Ela mergulhou no chão e começou a bracejar e espernear como se estivesse a nadar em alta competição, mas com o exercício de choro acrescentado. Tomei esta atitude como um não e segui as instruções da embalagem, acrescentando uma colher de café de cardamomo em pó à água do arroz.
Entretanto chegou o meu marido, que levou a nossa pequena sereia de volta aos seus mundos fantásticos construídos a legos e eu fechei a porta da cozinha, pois prezo a minha intimidade quando estou atrás do avental.
Tirei os bifes da marinada e fritei-os em azeite bem quente, três minutos de cada lado. Embrulhei os bifes em papel de alumínio e deixei descansar por 15 minutos. Assim os bifes cozinham no seu próprio calor, não perdendo sabor. O tempo inicial de fritura e de repouso varia conforme o nível de cocção que se deseja para os bifes. Estes ficaram bem passados. Quem preferir bifes rosados por dentro, deverá diminuir os tempos de fritura e repouso, tendo sempre em conta a altura do bife.
Agora era hora de fazer o molho, cujo primeiro ingrediente seriam 60mL de saké. Não tinha, então pus um cálice de grappa numa panelinha pequena ao lume. E enquanto o alcool evaporava, eu é que comecei a sentir-me levitar para outros mundos, mas concerteza bem diferentes dos mundos por onde a minha filha e o meu marido andavam a esta hora. Já a cantarolar e na verdadeira “mood” para a celebração, apaguei o lume e juntei à grappa 1 c.s. de molho de soja, 3 gotas de molho de peixe nam pla, 1 colher de chá de molho worcestershire e mais uma colher de chá da mostarda em grão. Juntei a este molho os sucos que se formaram durante o repouso da carne no papel de alumínio e mexi. Pus os bifes num tabuleiro, reguei com este molho e salpiquei com os coentros picados. Fui à mesa ainda enebriada com a grappa, e confesso que, neste caos de cheiros, sabores e grappa que me enebriaram os sentidos durante estes cozinhados à porta fechada, foram os coentros que sobressaíram e deram uma nota fresca e bastante positiva à mistura de sabores e tons que compuseram este prato. O meu marido, que mantinha o seu olfacto e paladar intactos, aprovou a combinação. A minha filha aprovou o bife simples temperado com alho e limão que lhe fiz e contou-me o seu dia em mundos que eu já não sabia existirem e numa linguagem que eu ainda desconheço.