… foi feito com as sobras da noite de consoada. Tinha batatas com alho, tomate cherry assado com azeite e temperado com coentros, tinha carne com molho, muito molho, e tinha a crosta verde. Faltava, mesmo com esta crosta, mais verde. Comecei por suar um zucchini e os floretes de meio bróculo numa frigideira com um pequeno gole de água e só por 5 minutos. Numa forma de barro redonda, fiz uma cama com as fatias de batata e os alhos despidos de sua camisa. Dispus o zucchini, os bróculos e pouco tomate que sobrou por cima das batatas. Depois, foi a carne, cortada em pequenos pedacinhos, para esta cama verde. Reguei agora tudo com o seu consistente molho de legumes e espalhei a crosta verde por cima, qual um crumble verde. Foi ao forno por cerca de 15 minutos a 180 graus, até a crosta dourar e foi para a mesa. E soube tão bem prolongar desta maneira o jantar de consoada para o dia de Natal!
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Os restos e o moral da estória
E há outros dias assim. Em que o apetite fugiu para um outro lugar. Não o meu, pois as minhas calças de ganga fazem-me lembrar activa e constantemente da sua presença. Refiro-me ao apetite da minha filhota, que normalmente come o peixe cozido com legumes com voracidade. Ou que se delicia primeiro com o queijo ou o fiambre, depois lambe a manteiga da fatia de pão e, finalmente, decide comer o pão. Desta vez o cenário foi diferente: ao lanche, pão e migalhas ficaram esquecidos no prato, o queijo levou uma dentadinha e foi rejeitado e o fiambre foi simplesmente ignorado; ao jantar, o prato foi tocado para dar uma trinca numa cenoura, que de imediato foi rejeitada, o peixe foi esquecido e a couve-flor ignorada.
E eu ignorei o cenário, indo para a cozinha mas levando comigo os pratos de comida rejeitados, esquecidos e ignorados. Tirei um caldo de peixe do frigorífico (quando fazemos peixe, ponho sempre as peles, espinhas e cabeca a cozer com algumas ervas aromáticas durante uma hora para sugar os aromas do animal marinho até ao tutano), juntei ao peixe e legumes ignorados um resto de risotto de grão esquecido de outros dias e levei ao lume. Peguei no pão desprezado e em algumas côdeas esquecidas na caixa do pão, cortei em cubinhos de 1 cm e levei ao forno a 175 graus. Fui à horta apanhar um raminho de salsa, desliguei o lume, apaguei o forno, piquei a salsa, dei um toque com a varinha mágica à sopa, pus no prato, dispus a salsa, um fio de azeite e o pão transformado em micro tostas e todos nos deliciamos! A pequerrucha mostrou então que o seu apetite voltou, ou voltou a mostrar-me a dura realidade: muitas vezes não é só o conteúdo que interessa, mas a maneira como se apresenta. Eu resolvi ignorar esta lição de vida e preferi acreditar simplesmente que o todo é mais que a soma das partes.
Os restos dos restos dos restos
Do jantar de há dois dias sobrou um molho de goulash que o meu marido fez e que eu adjectivaria de delicioso se as minhas papilas gostativas não estivessem KO. Não consegui sentir os sabores e aromas mas sei que estava de comer e chorar por mais.
Para acompanhar este resto de molho, ontem fiz migas com chouriço para o jantar. Comecei por fritar a cebola e o alho com pimentão doce e meia folha de louro e umas falhas de chouriço e sementes de coentros. Quando a cebola amoleceu, retirei, juntei os restos de pao, que neste caso era pao branco e pao integral e fui deitando água a ferver enquanto o pao a bebia. Juntei uma malagueta e continuei a mexer. Quando o pão ficou bem em papa, deixei cozinhar mais um pouco para a água evaporar, voltei a juntar as cebolas e o chouriço e mexi tudo por mais uns minutos. Quando ficou bem sequinha, juntei duas belas colheres desta conserva de coentros, passei para uma travessa de barro e pus no forno a 75 graus para não arrefecer. Como o ovo estrelado é unha e carne com as migas, na mesma frigideira, pus mais um golinho de azeite e estrelei 4 ovos. No prato, pus os ovos a acompanhar as migas, a acompanhar o resto do goulash. Mesmo com as papilas gostativas em hibernação, soube-me a pouco, repeti as migas e mesmo assim ainda sobraram.
Para acompanhar o resto das migas, fiz hoje ao almoço couves verdes temperadas com alho, limão, azeite e mostarda. No prato, pus uma lata de sardinhas a acompanhar as couves, a acompanhar as migas. As minhas papilas começaram a acordar e consegui sentir pelo menos o sabor do alho e um leve cheiro a sardinhas! Foi um prato que me deixou satisfeita.
Porque três foi a conta que alguém fez, houve restos mais uma vez. De couve. Pus batatas e cenouras aos cubos na panela com muito pouca água e, quando esta comecou a ferver, pus uns filetes de Redfish por cima dos legumes. No prato, pus as batatas e cenouras a acompanhar o peixe, a acompanhar a couve. Excepto no da minha filha, que rejeitou a couve mas comeu com um apetite voraz o peixe cozido com legumes e regado com azeite!