Queijo para esquecer e para um aniversário

Tinha uma reunião muito importante. Pela qual esperei anos. Comecei a preparar-me no dia anterior, comendo um leve jantar. Fiz uma salada salada com canónigos,  queijo de nisa cortado em quadradinhos muito pequenos, pevides tostadas, óleo de pevide e maçã ralada.

No dia seguinte, acordei, dei os bons dias ao céu cinzento e frio que ameaçava lá fora, bebi um copo de água gigante, espreguicei-me longamente e, continuando a preparar-me para o grande dia, até uma sessão de yoga  na sala eu fiz.

Meia hora depois, estava à mesa para tomar o pequeno almoço lentamente: pão de centeio com sementes, tostado, barrado com mel, com queijo de cabra cremoso, quase a roçar o brie, e com pinhões por cima. A acompanhar, chá verde.

Fui para o trabalho. Às nove em ponto, bati à porta. A secretária disse-me: “entra”. Estranhei a pontualidade, mas quando vi o escritório vazio, compreendi. Ficámos à conversa, passaram 5, 10, 15, 20 minutos. Ela telefonou para o chefe.” A Sofia está aqui à tua espera”, ao que o chefe responde  “Ah, era hoje a reunião com a Sofia?! Esqueci-me completamente!!”. E eu pensei cá para comigo: “eu comi o queijo e tu é que esqueceste, ó chefe!”

Pois eu comi o queijo e não me esqueci nem da reunião nem do quinto aniversário do Cinco quartos de laranja!  Para a Laranjinha, aqui vai um jantar e um pequeno almoço com cinco ingredientes!

Bolo de laranja e amêndoa

Para comemorar o meu aniversário que já lá vai, pensei num bolo de dois andares, talvez um bolo de claras como este da Leonor, mas recheado com romã. Depois decidi que haveria era de fazer um bolo de alfazema e mascarpone. Partilhei com o meu marido esta minha decisão e ele questionou-a, argumentando que a alfazema tinha um sabor muito forte. Eu lembrei-lhe que era o meu aniversário e, assim sendo, a chef era eu. E ele aceitou, mas aconselhou-me a fazer um bolo pequeno, se queria fazê-lo mesmo, lembrando-me que a minha sogra nos tinha mandado uma tarte maravilhosa, a Linzertorte, e que poderíamos usá-la como bolo de aniversário. Voltei a lembrar-lhe quem era a chef do dia mas, ao pôr o avental, agi com parcimónia e pus de lado o bolo de alfazema.

Não tendo romãs em casa, questionei-me qual seria o bolo que calha sempre bem, é fácil de fazer e cujos ingredientes estão no meu armário. Ao olhar a paisagem branca que a janela me oferece, respondi à charada com o bolo de laranja da Avó. Segui as instruções quase à risca, fazendo uma “pequena” alteração: substituí a totalidade da farinha pela mesma quantidade de amêndoa moída. Forrei uma forma circular de 18cm com papel vegetal, que se revelou pequena demais, pondo o resto da massa numa outra de 20 cm. Foram ao forno conforme as indicações e foi com prazer que vi o meu bolo crescer! Mas este prazer revelou-se efémero, seguido da desilusão de ver o bolo cair, formando um vale na sua forma. Pensei que estava tudo perdido e lá teria eu que acender a minha vela na Linzertorte, entretanto já esfaqueada sem parcimónia. Mas se está perdido por cem também o estará por valores mais altos, o que me levou a fazer um creme de mascarpone, inspirada na neve que cobria o chão. Bati 250 g de marcarpone com 3 colheres de açúcar e sumo e raspa de uma laranja, usando a vara de arames. Retirei o bolo  maior da forma e coloquei-o no prato de servir, o que não foi tarefa fácil, pois o bolo agarrou-se ao papel e partiu-se nas bordas que, devido à falta de farinha, ficaram estaladiças, quase a lembrar uma Pavlova. Barrei o creme por cima do bolo e de lado, tentando disfarças as bordas quebradas. Coloquei o bolo mais pequeno por cima, barrando agora só nos lados porque já não havia mais recheio. Sem esperança, pus o bolo no frigorífico e contei ao meu marido as minhas desventuras na cozinha, que logo me explicou o erro em não usar farinha.

No dia seguinte, depois do jantar, fui buscar o bolo e pus uma pequena vela vermelha que acendi sem qualquer esperança na qualidade do bolo. Ao apagá-la, desejei-nos mais um ano de amor eterno, entrelaçando olhares transbordantes de esperança com a minha família. Cortei o bolo, provámos e, não sei se foi a alquimia do amor ou se algum duende da Lapónia veio ao meu frigorífico durante a noite, mas a verdade é que o bolo ficou delicioso, fofo e húmido – a provar, mais uma vez, que uma receita da Avó nunca falha! 😉

tique taque

Sempre gostei de comemorar o meu aniversário. Seja com uma grande festa e amigos, seja só com a família chegada, é para mim um dia como nenhum outro, em que sinto uma energia transbordante, como se renascesse. Gosto de brincar com o número de anos que nos rotulam de idoso, adulto, criança, mas a minha relação com estes números não passa disso. Porque não envelheço mais um ano no dia em que nasci, vou sim caminhando no tempo a cada tique do relógio. E faço do tique do relógio que não uso, o torque para mais um momento de vida. Sempre em frente e nunca em contra relógio, pois eu gosto de tomar o meu tempo para tudo, especialmente quando vejo a ansiedade a espreitar à janela, à procura de uma fresta para entrar. Mas esta é aquela convidada que não entra nestas celebrações!!

Este ano celebrei com o meu marido e a minha filha. Cantámos os parabéns ainda sem bolo, dançámos, rimos e fomos ao mercado de Natal, onde voltei a andar de carrocel pela primeira vez. Ao serão, mandámos o frio embora com um bolo de laranja e amêndoa da chef e lombo de porco no forno do chef.

Tertúlia de sabores prussianos

É sempre assim quando tenho convidados. À hora marcada, ainda estou de avental e cabelos no ar e, quando toca a campaínha, não tenho outro remédio que não convidá-los a entrar na cozinha enquanto eu tento acabar tudo o que me tinha proposto fazer e os entretenho com um copo de vinho. Confesso que gosto de cozinhar assim, desde que o nariz dos convidados fique no vinho e não nas minhas panelas! Mas desta vez, tudo foi diferente. Primeiro, porque a minha convidada é virtual e, nestes convívios, o tempo e o espaço não impõem as mesmas restrições e segundo porque quem andou com o nariz nas panelas dos outros, descaradamente, fui eu. Isto tudo porque queria fazer uma refeição tipicamente germânica que relembrasse à minha tão querida convidada, a Moira, que todos nós conhecemos, os seus tempos pelo Sul da Alemanha! E quando se quer uma boa refeição germânica, pede-se a um germânico que a faça. Bom, neste caso, aproveitei a presença da minha Sogra cá em casa para fazer com o meu marido “Spätzle mit Rouladen”.  Spätzle é uma massa típica alemã, cuja tradução à letra, significa pardalinho. Qual a relação, não sei. Mas a verdade é que esta massa, no prato, parece um ninho! Pedi a receita à minha sogra e ela disse: ovos, farinha e água. E quantidades? Então, vês quando tiver uma boa consistência. Bom, esta estória já é velha, então o meu marido, prevenido e metódico, já tinha na sua história, a estória de tentativa e erro até chegar à consistência certa desta massa. Então ele fez assim: juntou 175 g de farinha, 2 ovos, 250 mL de água, sal e um gole de óleo. mexeu com a colher de pau, formando círculos e de cima para baixo. A massa fica com uma consistência muito forte e nada fluída.

Deixou a massa descansar durante 15 minutos. Entretanto, pôs muita água a ferver numa panela. Quando a água borbulhava fortemente pôs sal e óleo e encheu a máquina de pressionar o Spätzle.

Encaixou-a na panela, pressionou a massa para a água borbulhante e repetiu a operação enquanto houve massa.

Tapou bem a panela, pressionando a tampa e deixou cozinhar em lume alto durante 2 ou 3 minutos.  A massa está cozida quando vem ao de cima. Retirou para uma travessa.

Nesta altura já a minha sogra tinha os rolos de carne, ou rouladen, prontos. Que devem começar a preparar-se muito antes do Spaetzle – eu é que comecei a estória pela fim! Então ela fez assim: dispôs numa tábua os bifes finos e compridos. Barrou-os com mostarda em grão e recheou-os com cebola, salsa e bacon picados. Enrolou-os e prendeu-os com fio de cozinha. Marcou-os em azeite quente até dourarem. Retirou e juntou mais salsa, cebola e bacon picados e deixou refogar com cenoura, tomate e vinho tinto (e sal e pimenta). Deixou o molho apurar, reduziu a puré e voltou a juntar os bifes ao molho. Tapou a panela e levou-a ao forno durante uma hora. Levámos o “Spätzle mit Rouladen” à mesa e convidámos a Moira a sentar-se connosco. Moira, espero que tenhas gostado desta refeição, mas a noite ainda agora é uma criança. Depois do jantar, pomos os cachecóis e os gorros, as luvas e o casaco mais quente e acompanhamos o frio até ao Mercado de Natal no centro da cidade, para beber um Glühwein, que não deixa o frio entrar alma a dentro – até porque temos o coração quentinho com tão boa companhia para jantar!

(clique na imagem para os devidos créditos)

Há festa no Reino da Prússia!

Os últimos dias têm sido uma azáfama aqui no Reino da Prússia, a preparar todos os festejos que este primeiro aniversário pede. No dia da festa, até o tempo esteve de feição e o Sol abriu e deixou-nos festejar no jardim, onde as crianças correm, riem e brincam pela relva e as mesas estão cheias de iguarias, preparadas com tanto carinho pelos convidados e tão cheias de estórias, história e memórias. A conversa está animada.

Este ano de vida do Reino tem sido para mim um prazer. Virtualmente, conheci pessoas fantásticas, que me deixaram espreitar os seus mundos pelas portas dos seus blogues e suas cozinhas. Mas confesso que, quando criei o Reino da Prússia, não sabia ainda que seria um blogue dedicado ao que fazemos para o jantar. Foi o que acabou por acontecer, mas vim a descobrir que afinal este blogue é mais, muito mais que o blog com receitas e as aventuras do dia a dia de uma família como qualquer outra, como os meus queridos leitores me mostram com as pesquisas que os trazem até aqui. No top do ranking de pesquisas, está o Reino da Prússia, logo seguido da sopa de Santa Teresinha, nas suas  mais variadas facetas. Seja ela terzinha, tresinha ou simplesmente teresa. Até aqui sem surpresas. Surpresa foi quando descobri que este espaço faz também a vez de conselheiro sentimental. Alguém à procura de “simpatia para marido confessar a verdade”, ou “simpatia para murchar o pau do marido” veio parar a uma das minhas receitas… Sendo conselheiro sentimental, é natural que também fosse conselheiro familiar e, num momento que acredito de desespero, alguém tentou “ahh desifrar o choro do bebe”, por entre as entrelinhas do blog, pois receita para tal não tenho mas gostaria de ter! Mas outra faceta surpreendeu-me deveras, quando as estatísticas me disseram que alguém cá veio à procura de “fotos de senhoras roliças”! Nem sei bem em que categoria se insere, mas sei que vai arrancar uma gargalhada de uma lady aqui na festa, tal como me arrancou a mim! 🙂

Mas chega de discursos e vamos espreitar as participações, todas elas fantásticas. Foram 14 participações e 14 maneiras diferentes de ver a gastronomia, de reviver memórias, de contar um conto, voltar à infância, enfim. As estórias foram todas de tanta qualidade que, se tivesse que escolher a melhor, teria um grande problema! As vossas estórias fizeram-me revisitar momentos da minha infância, emocionaram-me por vezes e mostraram-me um bocadinho do coração de cada um de vós, num espaço virtual onde não se vêem as caras.

Os participantes, por ordem de chegada, foram:

  1. José Doutel Coroado, Vilarandelo – um dia uma imagem, Aldeia dos quatro montes
  2. Pipoka, Three Fat Ladies, No reino da infância: moelas estufadas
  3. Filipa, Recipe Box and Co., Sweet Sweet
  4. Miguel, Cozinha sem tabus, Simplesmente figos
  5. Ameixinha, Canela moída, O teu Reino por um dióspiro
  6. Babette, A festa de Babette, Bolo chiffon de chocolate com cobertura
  7. Marta, Intrusa na cozinha, De volta às origens
  8. Suzana, Gourmets amadores, No reino da Prússia com um prato de cogumelos
  9. Carla, De Cozinha em Cozinha passando pela Minha, Do reino das memórias para o Reino da Prússia
  10. Moira, Tertúlia de Sabores, Estórias e Histórias
  11. Margarida e Carolina, Caderninho de receitas, “Tertúlia Virtual de Sabores” – No Reino da Prússia
  12. Argas, Os temperos da Argas, Brioche de abóbora e cranberries
  13. Margarida, Figo Lampo, Das estórias e tradições do meu reino
  14. Luis, Trans-Siberiano, Da epopeia da baunilha à física do caracol

Vamos então dar a volta à roleta para saber quem foi @ feliz comtenplad@!

Luís, do Trans-Siberiano, foi o sortudo! Muitos Parabéns! Fico à espera do teu contacto para te enviar o Kafka´s Soup! Obrigada a tod@s pela vossa participação!

E agora está na hora de irmos então até à lareira com as vossas preciosas estórias e deliciosos petiscos para um serão bem passado…

2 boas notícias

Os convidados que vão chegando ao Reino  trazem consigo participações fantásticas. Trazem estórias da sua própria história ou da sua imaginação, trazem receitas, sabores, cores, cheiros, memórias!…

E agora a primeira boa notícia: o prazo foi alargado até dia 1 de Novembro. Quem quiser, pode ainda participar até segunda feira à meia noite!

A segunda boa notícia é que, tendo recebido o Reino até agora participações tão bonitas e com tanto carinho, não consegui resistir a oferecer uma simbólica lembrança. Será o livro Kafka´s Soup, de Mark Crick, a sortear durante as festas oficiais do Reino, que hão-de chegar na próxima semana!